VI. OS AMANTES (OU OS IRMÃOS)
Esta carta e sua gêmea, XIV (Arte), são os mais obscuros e difíceis dos Atu. Cada um destes símbolos é em si mesmo duplo, de modo que os significados formam uma série divergente e a integração da carta só pode ser reconquistada mediante casamentos e identificações reiterados, e alguma forma de hermafroditismo.
E, no entanto, a atribuição é a essência da simplicidade. O Atu VI se refere a Gêmeos, regido por Mercúrio. A letra hebraica correspondente é Zain, que significa espada, e a estrutura da carta é portanto o arco de Espadas abaixo do qual o casamento real acontece.
A espada é primeiramente um engenho de divisão. No mundo intelectual - que é o mundo do naipe de Espadas - ela representa análise. Esta carta e o Atu XIV juntos compõem a máxima alquímica abrangente: Solve et coagula.
Esta carta é, por conseguinte, uma das mais fundamentais do Tarô. É a primeira carta na qual mais de uma figura aparece (o macaco de Thoth no Atu I é apenas uma sombra). Em sua forma original, foi a história da Criação.
Acrescemos aqui, em função de seu interesse histórico, a descrição desta carta em sua forma primitiva, o que é extraído de Liber 418.
“Há uma lenda assíria de uma mulher com um peixe e há também uma lenda de Eva e a Serpente, pois Caim era o filho de Eva e a Serpente, e não de Eva e Adão; e, portanto, quando ele assassinara seu irmão, que foi o primeiro assassino por ter sacrificado coisas vivas ao seu demônio, Caim recebeu a marca em sua fronte, que é a marca da Besta referida no Apocalipse e o sinal da iniciação.
“O derramamento de sangue é necessário pois Deus não ouviu os filhos de Eva até que o sangue fosse derramado. E isto é religião externa; mas Caim não falou a Deus nem recebeu a marca de iniciação sobre sua fronte, de sorte que fosse evitado por todos os homens, até que tivesse derramado sangue. E este sangue foi o sangue de seu irmão. Este é um mistério da sexta chave do Tarô, que não deve ser chamada de Os Amantes, mas sim Os Irmãos.
“No meio da carta posta-se Caim; em sua mão direita está o martelo de Thor com o qual ele assassinara seu irmão, e está todo tinto de seu sangue. Sua mão esquerda ele mantém aberta como um sinal de inocência. Sobre sua mão direita está sua mãe Eva, ao redor da qual a serpente se enrosca com seu capelo desdobrado atrás da cabeça dela, e sobre sua mão esquerda encontra-se uma figura um tanto semelhante a Kali indiana, mas muito mais sedutora. Todavia, eu sei que é Lilith. E acima dele está o Grande Sigillum da Seta, voltado para baixo, atingindo o coração da criança. Esta criança é também Abel. E o significado desta parte da carta é obscuro, mas este é o desenho correto da carta do Tarô; e esta é a fábula mágica correta da qual os escribas hebreus, que não eram iniciados completos, furtaram sua lenda da Queda e os eventos subseqüentes.”
É bastante significativo que quase toda sentença deste trecho parece inverter o significado da anterior. Isto é porque a reação é sempre igual e oposta à ação. Esta equação é, ou deveria ser, simultânea no mundo intelectual, onde não existe grande retardamento de tempo; a formulação de qualquer idéia cria sua contraditória quase no mesmo momento. A contraditória de qualquer proposição está implícita nela mesma. Isto é necessário para preservar o equilíbrio do universo. A teoria foi explicada na exposição sobre o Atu I, O Prestidigitador, mas faz-se mister que seja agora enfatizada a fim de se interpretar esta carta.
A chave é que a carta representa a Criação do Mundo. Os hierarcas mantinham este segredo como de transcendente importância. Conseqüentemente, os iniciados que publicaram o Tarô para uso durante o Aeon de Osíris substituíram a carta original acima descrita em The Vision and the Voice. Estavam interessados em criar um novo universo próprio; eles eram os pais da Ciência. Seus métodos de trabalho, agrupados sob o termo genérico de alquimia, jamais foram tornados públicos. O ponto interessante é que todos os desenvolvimentos da ciência moderna nos últimos cinqüenta anos têm proporcionado às pessoas inteligentes e instruídas a oportunidade de refletir que toda a tendência da ciência tem sido retornar aos objetivos e mutatis mutandis aos métodos alquímicos. O segredo observado pelos alquimistas tornou-se necessário devido ao poder de perseguição de Igrejas. Tão amargamente quanto os beatos intolerantes lutavam entre si, eles estavam igualmente preocupados em destruir a ciência infante, a qual, como reconheciam instintivamente, colocaria um fim na ignorância e na fé das quais dependiam o poder e a riqueza deles.
O assunto desta carta é a análise, seguida pela síntese. A primeira pergunta feita pela ciência é: “Do que são compostas as coisas ? “ Respondida esta pergunta, a seguinte pergunta é: “ Como iremos recombiná-las para o nosso máximo proveito ?” Isto resume toda a política do Tarô.
A figura encapuzada que ocupa o centro da carta é uma outra forma de O Eremita, o qual é elucidado na seqüência no Atu IX. Ele próprio é uma forma do deus Mercúrio descrito no Atu I; ele está rigorosamente encoberto, como para significar que a razão última das coisas está num domínio além da manifestação e do intelecto (como explicado alhures, apenas duas operações são, no final das contas, possíveis: análise e síntese). Ele está de pé no sinal do entrante, como se projetando as forças misteriosas da criação. Ao redor de seus braços se acha um rolo de pergaminho, indicativo da Palavra que é semelhante à essência e mensagem dele. Mas o sinal do entrante é também o sinal da bênção e da consagração, de maneira que sua ação nesta carta é a celebração do casamento hermético. Atrás dele estão as figuras de Eva, Lilith e Cupido. Este simbolismo foi incorporado para preservar em alguma medida a forma original da carta e mostrar sua origem, sua herança e sua continuidade com o passado. Na aljava de Cupido está inscrita a palavra Thelema que é a Palavra da Lei (ver Liber AL, cap. I, versículo 39). Suas setas são quanta de Vontade. É assim indicado que esta fórmula fundamental de operação mágica, análise e síntese persiste através dos Aeons.
Podemos passar agora a considerar o próprio casamento hermético.
Esta parte da carta é uma simplificação de o Casamento Químico de Christian Rosenkreutz, uma obra prima excessivamente extensa e prolixa para ser citada proveitosamente aqui. Mas a essência da análise é a gangorra contínua de idéias contraditórias. É um glifo da dualidade. As pessoas da realeza envolvidas são o rei negro ou mouro com uma coroa de ouro e a rainha branca com uma coroa de prata. Ele está acompanhado do leão vermelho, e ela da águia branca. Estes são símbolos dos princípios masculino e feminino na natureza; são, portanto, igualmente, em vários estágios da manifestação Sol e Lua, Fogo e Água, Ar e Terra. Em química eles se apresentam como ácido e álcali, ou (mais profundamente) metais e não-metais, tomando-se estas palavras em seu mais lato sentido filosófico a fim de incluir o hidrogênio por um lado e o oxigênio, por outro. Neste aspecto, a figura encapuzada representa o elemento protéico do carbono, a semente de toda a vida orgânica.
O simbolismo do masculino e o feminino é continuado ainda pelas armas do rei e da rainha. Ele porta a Lança Sagrada e ela, o Cálice Sagrado; as outras mãos deles estão unidas, como que consentindo com o casamento. Suas armas são apoiadas por crianças gêmeas, cujas posições estão trocadas, pois a criança branca não só oferece apoio ao cálice como também carrega rosas, enquanto que a criança negra, segurando a lança de seu pai, carrega também o porrete, um símbolo equivalente. Na base do conjunto está o resultado do casamento sob forma primitiva e pantomórfica: o ovo órfico alado. Este ovo representa a essência de toda essa vida sujeita a esta fórmula do masculino e feminino. Prossegue o simbolismo das serpentes com as quais o manto do rei está ornamentado, e das abelhas que adornam o manto da rainha. O ovo é cinza, misturando branco e preto, de modo a significar a cooperação das três Superiores da Árvore da Vida. A cor da serpente é púrpura, Mercúrio na escala da rainha. É a influência desse deus manifestada na natureza, enquanto que as asas têm cor carmesim, a cor (na escala do rei) de Binah, a Grande Mãe. Neste símbolo existe, portanto, um glifo completo do equilíbrio necessário ao começo da Grande Obra. Mas, no que concerne ao mistério final, isto é deixado sem solução. Perfeito é o plano para produzir a vida, porém a natureza desta vida é ocultada. É capaz de assumir qualquer forma possível, mas qual forma ? Isto depende das influências presentes na gestação.
A figura no ar apresenta certa dificuldade. A interpretação tradicional diz que se trata de Cupido, e não fica claro, a princípio, o que Cupido tem a ver com Gêmeos. Nenhuma luz é lançada sobre este ponto ao considerar-se a posição do caminho na Árvore da Vida, pois Gêmeos conduz de Binah a Tiphareth. E aí, conseqüentemente, se levanta toda a questão de Cupido. Os deuses romanos geralmente representam um aspecto mais material dos deuses gregos dos quais são derivados, neste caso, Eros. Eros é o filho de Afrodite e a tradição diverge quanto a seu pai ser Ares, Zeus ou Hermes, quer dizer, Marte, Júpiter ou Mercúrio. Sua aparência nesta carta sugere que Hermes seja o verdadeiro progenitor e este parecer é confirmado pelo fato de não ser em absoluto fácil distingui-lo da criança Mercúrio pois eles têm em comum o desregramento, a irresponsabilidade e o gosto por pregar peças. Mas nesta imagem existem características peculiares. Ele carrega um arco e flechas numa aljava dourada (é representado, por vezes, com uma tocha); tem asas douradas e está vendado. Daí pode parecer que ele representa a vontade inteligente (e, ao mesmo tempo, inconsciente) da alma de unir a si mesma com tudo e todos, como foi explicado na fórmula geral relativa à agonia da separação.
Não se atribui importância muito especial em figuras alquímicas ao Cupido. Contudo, num certo sentido, ele é a fonte de toda a ação, a libido para expressar zero como dois. De um outro ponto de vista, é possível considerá-lo como o aspecto intelectual da influência de Binah sobre Tiphareth pois (em uma tradição) o título da carta é “Os Crianças da Voz, o Oráculo dos Deuses Poderosos”. Deste ponto de vista, ele é um símbolo da inspiração, descendo sobre a figura encapuzada, que é, neste caso, um profeta que opera a união do rei e a rainha. Sua flecha representa a inteligência espiritual necessária nas operações alquímicas, mais do que a mera fome de executá-las. Por outro lado, a flecha é peculiarmente um símbolo de direção, e é, portanto, apropriado colocar a palavra Thelema em letras gregas sobre a aljava. Deve-se também observar que a carta contraposta, Sagitário, * significa Aquele que porta a Flecha, ou o Arqueiro, uma figura que não aparece sob forma alguma no Atu XIV. Estas duas cartas são tão complementares que não podem ser estudadas isoladamente para completa interpretação.
* Isto é, Arte (Atu XIV) (NT).
Esta carta e sua gêmea, XIV (Arte), são os mais obscuros e difíceis dos Atu. Cada um destes símbolos é em si mesmo duplo, de modo que os significados formam uma série divergente e a integração da carta só pode ser reconquistada mediante casamentos e identificações reiterados, e alguma forma de hermafroditismo.
E, no entanto, a atribuição é a essência da simplicidade. O Atu VI se refere a Gêmeos, regido por Mercúrio. A letra hebraica correspondente é Zain, que significa espada, e a estrutura da carta é portanto o arco de Espadas abaixo do qual o casamento real acontece.
A espada é primeiramente um engenho de divisão. No mundo intelectual - que é o mundo do naipe de Espadas - ela representa análise. Esta carta e o Atu XIV juntos compõem a máxima alquímica abrangente: Solve et coagula.
Esta carta é, por conseguinte, uma das mais fundamentais do Tarô. É a primeira carta na qual mais de uma figura aparece (o macaco de Thoth no Atu I é apenas uma sombra). Em sua forma original, foi a história da Criação.
Acrescemos aqui, em função de seu interesse histórico, a descrição desta carta em sua forma primitiva, o que é extraído de Liber 418.
“Há uma lenda assíria de uma mulher com um peixe e há também uma lenda de Eva e a Serpente, pois Caim era o filho de Eva e a Serpente, e não de Eva e Adão; e, portanto, quando ele assassinara seu irmão, que foi o primeiro assassino por ter sacrificado coisas vivas ao seu demônio, Caim recebeu a marca em sua fronte, que é a marca da Besta referida no Apocalipse e o sinal da iniciação.
“O derramamento de sangue é necessário pois Deus não ouviu os filhos de Eva até que o sangue fosse derramado. E isto é religião externa; mas Caim não falou a Deus nem recebeu a marca de iniciação sobre sua fronte, de sorte que fosse evitado por todos os homens, até que tivesse derramado sangue. E este sangue foi o sangue de seu irmão. Este é um mistério da sexta chave do Tarô, que não deve ser chamada de Os Amantes, mas sim Os Irmãos.
“No meio da carta posta-se Caim; em sua mão direita está o martelo de Thor com o qual ele assassinara seu irmão, e está todo tinto de seu sangue. Sua mão esquerda ele mantém aberta como um sinal de inocência. Sobre sua mão direita está sua mãe Eva, ao redor da qual a serpente se enrosca com seu capelo desdobrado atrás da cabeça dela, e sobre sua mão esquerda encontra-se uma figura um tanto semelhante a Kali indiana, mas muito mais sedutora. Todavia, eu sei que é Lilith. E acima dele está o Grande Sigillum da Seta, voltado para baixo, atingindo o coração da criança. Esta criança é também Abel. E o significado desta parte da carta é obscuro, mas este é o desenho correto da carta do Tarô; e esta é a fábula mágica correta da qual os escribas hebreus, que não eram iniciados completos, furtaram sua lenda da Queda e os eventos subseqüentes.”
É bastante significativo que quase toda sentença deste trecho parece inverter o significado da anterior. Isto é porque a reação é sempre igual e oposta à ação. Esta equação é, ou deveria ser, simultânea no mundo intelectual, onde não existe grande retardamento de tempo; a formulação de qualquer idéia cria sua contraditória quase no mesmo momento. A contraditória de qualquer proposição está implícita nela mesma. Isto é necessário para preservar o equilíbrio do universo. A teoria foi explicada na exposição sobre o Atu I, O Prestidigitador, mas faz-se mister que seja agora enfatizada a fim de se interpretar esta carta.
A chave é que a carta representa a Criação do Mundo. Os hierarcas mantinham este segredo como de transcendente importância. Conseqüentemente, os iniciados que publicaram o Tarô para uso durante o Aeon de Osíris substituíram a carta original acima descrita em The Vision and the Voice. Estavam interessados em criar um novo universo próprio; eles eram os pais da Ciência. Seus métodos de trabalho, agrupados sob o termo genérico de alquimia, jamais foram tornados públicos. O ponto interessante é que todos os desenvolvimentos da ciência moderna nos últimos cinqüenta anos têm proporcionado às pessoas inteligentes e instruídas a oportunidade de refletir que toda a tendência da ciência tem sido retornar aos objetivos e mutatis mutandis aos métodos alquímicos. O segredo observado pelos alquimistas tornou-se necessário devido ao poder de perseguição de Igrejas. Tão amargamente quanto os beatos intolerantes lutavam entre si, eles estavam igualmente preocupados em destruir a ciência infante, a qual, como reconheciam instintivamente, colocaria um fim na ignorância e na fé das quais dependiam o poder e a riqueza deles.
O assunto desta carta é a análise, seguida pela síntese. A primeira pergunta feita pela ciência é: “Do que são compostas as coisas ? “ Respondida esta pergunta, a seguinte pergunta é: “ Como iremos recombiná-las para o nosso máximo proveito ?” Isto resume toda a política do Tarô.
A figura encapuzada que ocupa o centro da carta é uma outra forma de O Eremita, o qual é elucidado na seqüência no Atu IX. Ele próprio é uma forma do deus Mercúrio descrito no Atu I; ele está rigorosamente encoberto, como para significar que a razão última das coisas está num domínio além da manifestação e do intelecto (como explicado alhures, apenas duas operações são, no final das contas, possíveis: análise e síntese). Ele está de pé no sinal do entrante, como se projetando as forças misteriosas da criação. Ao redor de seus braços se acha um rolo de pergaminho, indicativo da Palavra que é semelhante à essência e mensagem dele. Mas o sinal do entrante é também o sinal da bênção e da consagração, de maneira que sua ação nesta carta é a celebração do casamento hermético. Atrás dele estão as figuras de Eva, Lilith e Cupido. Este simbolismo foi incorporado para preservar em alguma medida a forma original da carta e mostrar sua origem, sua herança e sua continuidade com o passado. Na aljava de Cupido está inscrita a palavra Thelema que é a Palavra da Lei (ver Liber AL, cap. I, versículo 39). Suas setas são quanta de Vontade. É assim indicado que esta fórmula fundamental de operação mágica, análise e síntese persiste através dos Aeons.
Podemos passar agora a considerar o próprio casamento hermético.
Esta parte da carta é uma simplificação de o Casamento Químico de Christian Rosenkreutz, uma obra prima excessivamente extensa e prolixa para ser citada proveitosamente aqui. Mas a essência da análise é a gangorra contínua de idéias contraditórias. É um glifo da dualidade. As pessoas da realeza envolvidas são o rei negro ou mouro com uma coroa de ouro e a rainha branca com uma coroa de prata. Ele está acompanhado do leão vermelho, e ela da águia branca. Estes são símbolos dos princípios masculino e feminino na natureza; são, portanto, igualmente, em vários estágios da manifestação Sol e Lua, Fogo e Água, Ar e Terra. Em química eles se apresentam como ácido e álcali, ou (mais profundamente) metais e não-metais, tomando-se estas palavras em seu mais lato sentido filosófico a fim de incluir o hidrogênio por um lado e o oxigênio, por outro. Neste aspecto, a figura encapuzada representa o elemento protéico do carbono, a semente de toda a vida orgânica.
O simbolismo do masculino e o feminino é continuado ainda pelas armas do rei e da rainha. Ele porta a Lança Sagrada e ela, o Cálice Sagrado; as outras mãos deles estão unidas, como que consentindo com o casamento. Suas armas são apoiadas por crianças gêmeas, cujas posições estão trocadas, pois a criança branca não só oferece apoio ao cálice como também carrega rosas, enquanto que a criança negra, segurando a lança de seu pai, carrega também o porrete, um símbolo equivalente. Na base do conjunto está o resultado do casamento sob forma primitiva e pantomórfica: o ovo órfico alado. Este ovo representa a essência de toda essa vida sujeita a esta fórmula do masculino e feminino. Prossegue o simbolismo das serpentes com as quais o manto do rei está ornamentado, e das abelhas que adornam o manto da rainha. O ovo é cinza, misturando branco e preto, de modo a significar a cooperação das três Superiores da Árvore da Vida. A cor da serpente é púrpura, Mercúrio na escala da rainha. É a influência desse deus manifestada na natureza, enquanto que as asas têm cor carmesim, a cor (na escala do rei) de Binah, a Grande Mãe. Neste símbolo existe, portanto, um glifo completo do equilíbrio necessário ao começo da Grande Obra. Mas, no que concerne ao mistério final, isto é deixado sem solução. Perfeito é o plano para produzir a vida, porém a natureza desta vida é ocultada. É capaz de assumir qualquer forma possível, mas qual forma ? Isto depende das influências presentes na gestação.
A figura no ar apresenta certa dificuldade. A interpretação tradicional diz que se trata de Cupido, e não fica claro, a princípio, o que Cupido tem a ver com Gêmeos. Nenhuma luz é lançada sobre este ponto ao considerar-se a posição do caminho na Árvore da Vida, pois Gêmeos conduz de Binah a Tiphareth. E aí, conseqüentemente, se levanta toda a questão de Cupido. Os deuses romanos geralmente representam um aspecto mais material dos deuses gregos dos quais são derivados, neste caso, Eros. Eros é o filho de Afrodite e a tradição diverge quanto a seu pai ser Ares, Zeus ou Hermes, quer dizer, Marte, Júpiter ou Mercúrio. Sua aparência nesta carta sugere que Hermes seja o verdadeiro progenitor e este parecer é confirmado pelo fato de não ser em absoluto fácil distingui-lo da criança Mercúrio pois eles têm em comum o desregramento, a irresponsabilidade e o gosto por pregar peças. Mas nesta imagem existem características peculiares. Ele carrega um arco e flechas numa aljava dourada (é representado, por vezes, com uma tocha); tem asas douradas e está vendado. Daí pode parecer que ele representa a vontade inteligente (e, ao mesmo tempo, inconsciente) da alma de unir a si mesma com tudo e todos, como foi explicado na fórmula geral relativa à agonia da separação.
Não se atribui importância muito especial em figuras alquímicas ao Cupido. Contudo, num certo sentido, ele é a fonte de toda a ação, a libido para expressar zero como dois. De um outro ponto de vista, é possível considerá-lo como o aspecto intelectual da influência de Binah sobre Tiphareth pois (em uma tradição) o título da carta é “Os Crianças da Voz, o Oráculo dos Deuses Poderosos”. Deste ponto de vista, ele é um símbolo da inspiração, descendo sobre a figura encapuzada, que é, neste caso, um profeta que opera a união do rei e a rainha. Sua flecha representa a inteligência espiritual necessária nas operações alquímicas, mais do que a mera fome de executá-las. Por outro lado, a flecha é peculiarmente um símbolo de direção, e é, portanto, apropriado colocar a palavra Thelema em letras gregas sobre a aljava. Deve-se também observar que a carta contraposta, Sagitário, * significa Aquele que porta a Flecha, ou o Arqueiro, uma figura que não aparece sob forma alguma no Atu XIV. Estas duas cartas são tão complementares que não podem ser estudadas isoladamente para completa interpretação.
* Isto é, Arte (Atu XIV) (NT).
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